Marina Manda Lembranças Q ue bonita ficou Valentina na capa da revista Vogue! Que bonito ficou Manny como figura emblemática da linha de...
Marina Manda Lembranças
O gênero está deixando de ser uma obrigatoriedade de primeira opção. E devemos agradecer aos deuses por isso. Antes, os pais tinham que esperar até o nascimento para saber o gênero do filho. Agora é das primeiras coisas que sabem, mas estamos aprendendo que não é tão definitivo quanto parecia.
Vi um documentário sobre alfaiataria para trans. Nunca havia pensado nisso. Mas as mulheres que trocaram de sexo, certamente pensaram. Um terno concebido para corpo desde sempre masculino não lhes cai bem. Nem todas redesenham seu físico. Algumas mantêm os seios, os quadris são quase sempre mais pronunciados, há um certo volume posterior que levanta a aba do paletó. Um casal de dois homens, ou melhor, de um homem e uma fluida com experiência no assunto, abriu um atelier de alfaiataria especializada.
Sempre, quando vejo referências a trans, penso na tenacidade e no sofrimento que foram necessários para chegar à conquista da própria identidade. O que o trans vive como a entrada em sua verdadeira pele, a sua primeiríssima verdade, é visto pelos outros como uma transformação, uma mudança. Uma das personagens do documentário, passando a gravata por baixo do colarinho da camisa, contava sua tortura de infância tendo que usar roupas de menina cheias de babados, e a necessidade de chantagens familiares para escolher sua própria roupa.
Manny, de uma família mórmon muito religiosa, foi obrigado a submeter-se a uma terapia para reversão da homossexualidade. Tinha 17 anos.
No tempo em que trabalhei como editora de comportamento da revista Nova recebia muitas cartas. As dos jovens homossexuais em busca da sua realidade eram sempre sofridas. A maioria passava por duas etapas igualmente difíceis, primeiro a aceitação de si, depois a comunicação e imposição aos demais.
Hoje Manny é maquiador, tem 3,2 milhões de seguidores na Instagram, e 2,3 milhões no seu canal no You-Tube , MannyMua.
Não é Manny o único rosto masculino adotado pelas grandes marcas de maquilagem. A dupla mensagem, que chamamos de ambiguidade, está no dia a dia e foi garfada pela moda. Diz o slogan da Mascara London, que escolheu Lewys Ball, de 17 anos como seu rosto fetiche:"Todo mundo pode usar maquilagem, não importa quem você é". O que importa, dizem o slogan e o rosto viril, é o que você quer ser, é a mensagem que você quer mandar a quem te olha.
Valentina Sampaio, nasceu em Aquiraz, no interior do Ceará. Na foto que vi no jornal, provavelmente a mesma que saiu no Le Monde, tem uma cara sorridente de menina, sem bocão, sem carão, sem pose. Alegro-me de ver que o percurso que a trouxe até Paris não lhe estragou o sorriso.
Não sei como foi para Lea T, hoje Lea Cerezo, chegar às passarelas internacionais. Sei, porque li, que ela teve muito medo de ser rechaçada pelo pai, daí o T do seu nome de modelo. Só agora, admirada e famosa, tendo passado pela cirurgia de redesignação, trocou o T anônimo, pelo nome que sempre foi seu.