Marina Manda Lembranças A inda esta semana li matéria sobre a divisão do trabalho doméstico. O assunto costuma ganhar espaço na mídia se...
Marina Manda Lembranças
No Brasil, as mulheres trabalham na casa e nos cuidados com pessoas e filhos 2,5 vezes mais que os homens, dedicando a isso, em média, 25,9 horas semanais, contra as 15,5 horas dedicadas por eles. Não é de estranhar quando sabemos, através de pesquisa do Instituto Promundo, que 54% dos homens entrevistados sobre sua percepção dos trabalhos domésticos responderam que "o papel mais importante da mulher é cuidar da casa e cozinhar para a sua família", e 89% consideraram "inaceitável que a mulher não mantenha a casa em ordem".
Mas agora, na parte do mundo onde essas respostas não seriam aceitáveis, um lote ainda mais invisível desse trabalho está sendo denunciada. Toma para si a denominação que havia cunhada nos anos 70 para empresários: "carga mental". E tem sido assunto nas redes sociais nestes dias por causa dos quadrinhos da desenhista feminista francesa Emma, veiculados no Facebook sob o título "Fallait demander", ("tinha que pedir").
A bem dizer, a carga mental sempre existiu. Ou seja, a mulher sempre planejou, governou, administrou a casa e a família (no Brasil, as fazendeiras do passado são bom exemplo disso). Mas os homens mantinham postura de poder, faziam exigências, eram donos do pedaço.
Agora essa postura acabou — pelo menos em países mais horizontais, onde o comportamento tende a ser igualitário. O homem volta do trabalho e quer relaxar. Já a mulher, no caminho de volta do trabalho, vai fazendo anotações ou mentalizando tudo o que tem que ser feito para manter o andamento de casa e família, e antes de chegar é capaz de dar uma paradinha no supermercado para comprar um item do jantar ou entrar numa loja para providenciar meia para filho.
Elas dizem que eles não ajudam e que são incapazes. Eles dizem que elas não delegam, para poder controlar.
Elas se declaram estressadas. E soa justo. É como se fossem altas empresárias. Mas enquanto os altos empresários têm secretária executiva, assessores, auxiliares e planejadores, a mulher administra sua empresa doméstica desempenhando todas as funções. Por que assumimos carga tão pesada?
Por motivos históricos, inicialmente. Antes de entrarmos no mercado de trabalho, eles providenciavam o sustento, e nós o administrávamos. Uma divisão razoável, não fosse o desgaste dos partos — mas sempre soubemos que eles não podiam parir. Depois, quando prover o sustento tornou-se tarefa dividida, pareceu lógico dividir a administração. Não conseguimos, a não ser parcialmente.
Continuamos tendo que enfrentar a formação, a tradição, a musculatura, a prepotência. Mas é também questão de qualificação. E a ciência diz que as mulheres são mais qualificadas.
O cérebro feminino é constituído de modo a lidar com a multiplicidade melhor que o masculino. Os homens são bons para focar em um único ponto, em geral, o seu trabalho. As mulheres fazem várias coisas ao mesmo tempo, focadas em trabalho/casa/filhos, igualmente atentas e sem descuidar de nenhum item. Nosso cérebro tem vários olhos, nossa atenção é tentacular. Quem tem filhos sabe bem disso.
Os homens também sabem. Mas não é prudente confirmar. Se a carga física pesa, a mental pesa muito mais, e não queremos, certamente não queremos que seja nosso lote exclusivo.