Estamos falando de amor, mas é preciso especificar. Não existe um único amor ao qual todos obedecem, mas sim diferentes formas de amor,...
Estamos falando de amor, mas é preciso especificar. Não existe um único amor ao qual todos obedecem, mas sim diferentes formas de amor, variando não só de acordo com as diferentes culturas, mas também através da história. A história da humanidade é a história do seu amor. Ao contrário do que gostaríamos, o amor não é rei; obedece as necessidade sociais e se modifica de acordo com as exigências econômicas, geográficas, ou impostas pelas guerras.
Agora mesmo, depois de um longo período de descanso, o amor apaixonado parece estar de volta com toda a sua força. E o que foi que o trouxe? Segundo alguns, a alta dos preços do petróleo. Se livros sobre o amor e a paixão invadem as livrarias, se conferências sobre os mesmos temas pipocam nas noites, se o sexo volta a ser vinculado ao amor, e se um grande suspiro desejoso parece exalar de todos os peitos, agradeçamos à OPEP.
Antes da crise do petróleo o mundo, ou pelo menos a parte abastada do mundo, a que exporta e impõe sua cultura, nada em dinheiro. Era o tempo das vacas gordíssimas. E sobrando dinheiro, parecia mais fácil ser feliz. Tão fácil que se tornou praticamente obrigatório. Com dois carros na garagem, uma piscina de água quente no quintal, a cozinha abarrotada de eletrodomésticos, incontáveis opções de lazer, e conta bancária garantindo o futuro, parecia uma injúria ficar chorando pelos cantos. O trabalho já não era tão importante. Importante era satisfazer os próprios desejos.
E o desejo individual, colocado como meta, transformou impedimentos opressivos as relações com terceiros, os vínculos de amor, os enquadramentos sociais.Felizes e sozinhos, cuidando cada um de si, satisfazendo todos os seus desejos e livres do ônus amoroso, assim foram os representantes da geração do eu. Uma pesquisa realizada no final dos anos 70, nos Estados Unidos, pela firma Yankelovitch, Skelli & White, mostrou que setenta e dois por cento dos americanos passavam a maior parte de seu tempo pensando em si mesmos e nas suas necessidades interiores.
Paralelamente, os anticoncepcionais e os movimentos de liberação da mulher abriam um período de experimentação sexual, legitimando o não-compromisso.
Tudo era válido, e era obrigatório transformar as fantasias em realidade. Tudo, menos o amor consequente, pois como escrevia Joseph Epstein em seu livro Divorced in America, "as amarras e as obrigações do casamento impedem o pleno desenvolvimento do eu".
Então os árabes aumentaram o preço do petróleo, as vacas emagreceram, e já não era tão fácil ter piscina no fundo do quintal. A crise acabava com o mito da felicidade individual e reestabelecia a necessidade do grupo como defesa, a procura do outro. Em 1981, a revista Time publicou um artigo com declarações de Yankelovitch, que previam o surgimento de uma nova "ética do compromisso" sintetizada na "busca da comunidade". A revista ironizava dizendo haver poucos sinais de tal modificação. Mas hoje o sociólogo William Simon afirma: "abundância dos anos 50, 60 e 70 nos deu a coragem de tentar novas experiência. Com o atual estado da economia, a hora é de prudência. Centralizando tudo na segurança econômica e social, investimos mais na carreira e no casal. Nós nos perguntamos: 'como devo administrar minha energia, financeira e sentimentalmente?' e então a carreira parece mais importante que o sexo".
Sim, o amor está de volta. mas com ele volta também a necessidade de entendê-lo melhor, para que não nos traga mais dissabores que prazeres.
Do livro "E por falar em amor" (Círculo do Livro)