Estado de Minas A inda Ă© tempo de pĂȘssegos. E que safra suculenta temos tido! Para comemorar essa fartura, nada como tomar um Bellini, ...
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Passei diante do Harry’s Bar quando jovem, sem cacife para entrar. Agora volto a ele alongando a mĂŁo, e colhendo em minha estante o livro “Il mio Harry’s Bar”.
O Harry’s de hoje nĂŁo Ă© apenas um bar, Ă© uma holding com filiais no mundo inteiro. Mas em Veneza Ă© muito mais que um bar, Ă© uma tradição, que com o Festival de cinema, os cavalos de bronze da praça SĂŁo Marcos, e o chapinhar de gĂŽndolas e lanchas, forma uma coisa sĂł.
Certo, não é tão antigo quanto os canais, nenhum Doge teve o prazer de sentar-se a uma de suas mesinhas para um aperitivo ou um almoço, mas houve um dia, em 1935, em que em mesas diferentes estavam instalados quatro reis. Ali erguiam copos e empunhavam garfos Alfonso XIII da Espanha, Guilhermina da Holanda, Paulo I da Grécia, e Pedro II da Iugoslåvia.
Havia começado bem, pela mĂŁo de Giovanni Cipriani, em 1931. No primeiro e Ășnico livro de assinaturas do Bar constam Marconi, Toscanini, Chaplin, Somerset Maugham, Barbara Hutton, Hemingway, Truman Capote, e tantos outros que naquele tempo eram pessoas ilustres e hoje rebaixarĂamos para a categoria de famosos.
SĂł ficou fechado durante a Segunda Guerra quando, requisitado para tornar-se refeitĂłrio da Marinha, foi obrigado a mudar de nome. Harry nĂŁo servia para um paĂs em luta contra ingleses e americanos. Tornou-se Bar Arrigo, as autoridades fascistas nĂŁo se deram conta, ou se deram e lhes pareceu suficiente, que Arrigo era a tradução italiana de Harry.
Naqueles anos duros, quando as mulheres da famĂlia Cipriani desafiavam as metralhadoras para ir ao campo em busca de alimentos, muitos clientes continuaram indo por volta do meio dia bater Ă porta da casa de Giovanni para tomar seu aperitivo.
O cliente do Harry’s Bar atĂ© hoje mais citado Ă© Hemingway. Apareceu no bar pela primeira vez no inverno de 1949 e, a partir de entĂŁo, teve mesa fixa, a um canto. A foto dele com Giuseppe e uma fileira de copos vazios ainda estĂĄ junto Ă entrada.
Tomava dry Martini, que chamava Montgomery , e que devia obedecer a uma proporção precisa, segundo ele a mesma com que o general inglĂȘs gostava de guerrear: um por quinze. Uma dose de Martini Dry para quinze doses de gim ou, no caso da guerra, quinze soldados ingleses contra um soldado inimigo.
Para tomar Martini, ia ao Harry’s Bar, e para caçar patos selvagens hospedava-se na Locanda, numa das ilhas da laguna, tambĂ©m da famĂlia Cipriani. Ali Hemingway tinha um pequeno apartamento, e ali escreveu ”Do outro lado do rio, e entre as ĂĄrvores”.
Agora, Arrigo Cipriani, o filho, entrega a gerĂȘncia da holding ao fundo de investimentos que detĂȘm 20% da empresa. Ficam a histĂłria, a tradição, e as receitas. A do Bellini Ă© assim:
PĂȘssegos maduros, de casca rosada. Prosecco, melhor se for de Conegliano, ou mesmo champagne. Os pĂȘssegos devem ser espremidos no chinois, ou no espremedor de batatas, ou na centrĂfuga, nunca no liquidificador. SĂŁo 3/4 de prosecco e 1/4 de suco de pĂȘssego. A tomar gelado, com reverĂȘncia.
Foto: Giuseppe Cipriani e Ernest Hemingway