Marina Manda Lembranças D izer que o sexo mudou seria inexato, já que todas as possibilidades foram aproveitadas desde o início. Mais...
Marina Manda Lembranças
É o sexo por aplicativo, que fornece perfil, foto e posicionamento no espaço urbano. Estar próximo costuma ser elemento positivo, garantindo, se não alguma vaga similitude, a rapidez do encontro.
Se o taxista tem um aplicativo que lhe indica o caminho mais rápido e desimpedido para chegar ao endereço do frequês, por que o desejo não se utilizaria da mesma tecnologia? A modernidade existe para tudo. Melhor escolher, entre os tantos parceiros oferecidos, aquele que se encontra a poucas ruas de distância ou na esquina, aquele que chegará depressa para, se os deuses forem generosos, abraçar devagar.
Todo um novo código de conduta vem tacitamente embutido nos encontros via aplicativos.
Domingo, revista de O Globo, tira de Bruno Drummond, quadrinho 1) duas moças de pé, uma diz à outra: conheci o Roney por um aplicativo de celular, saímos na mesma noite; quadrinho 2) estende o celular para a outra ver, e diz: no dia seguinte me mandou essa foto; quadrinho 3) a outra se surpreende: é a genitália dele?
Pelos padrões atuais, Roney se excedeu. Mandou uma lembrancinha, quando tudo o que se deseja após esses encontros é a evaporação. Mandar flores ou cartão são cafonices do passado, na hera Tinder fazer-se presente no dia seguinte é mais que uma gafe, é uma desobediência às normas.
Jaqueline (nome falso) professora, 24 anos, está solteira há um ano. Em reportagem sobre "combate ao HIV", diz que só está interessada em sexo casual pela internet, e que não costuma rever os parceiros. No período, foram "aproximadamente" 20 — nenhuma necessidade de contas exatas quando os encontros não têm qualquer relevância.
"Todo mundo está em busca do Grande Amor — diz Cahterine Lejealle, socióloga das utilizações do digital — Mas enquanto este não acontece , aceita-se, ou melhor, decide-se procurar outra coisa, mais na esfera da libertinagem. Hoje temos uma verdadeira demanda de contato entre pessoas disponíveis: é a tarefa dos aplicativos."
Selecionar um rosto no aplicativo, obter a concordância do outro, tomar um café ou uma cerveja e subir para o quarto já tem nome. É o "hook up", termo que surgiu entre os gays para definir o encontro de uma noite ou de uma meia hora, e que a generalização do esporte espalhou. A generalização foi rápida. Uma pesquisa realizada na França revela que nos 3 últimos anos os utilizadores que buscam nos aplicativos aventuras sem seguimento passaram de 22% em 2012 para 38% em 2015. E quase a metade deles disse que desde o primeiro encontro escolheu não rever o/a parceiro/a.
Mathilde, uma francesa de 20 anos, estudante, usa todos os aplicativos de encontros. O sexo é uma distração. "Não procuro nada de sério, só aventuras... É engraçado, às vezes estou em "modo cadela", com vontade sem motivo. Tenho encontros de uma noite. ". Mas ela diz ainda " Tenho também programas eróticos regulares, porque, sexualmente, é melhor quando a gente se conhece um pouco mais fisicamente, para que eu tenha prazer."
Talvez estejamos criando dois tipos de prazer. Um prazer mais relaxado, com orgasmo, de parceria sexual. E um prazer gerado pela velocidade, pela sensação de estar surfando no próprio tempo, pela construção da própria imagem sensual, um prazer que inclui o outro apenas de maneira tangencial e o descarta.