Marina Manda Lembranças S emana passada prometi falar de Beijing. Mas, entre a semana passada e hoje estive em outro lugar, e é dele q...
Marina Manda Lembranças
Chegando da China, dei uma mínima respirada, troquei de mala, e fui com Affonso à Feira Internacional do Livro, a FIL, em Guadalajara. Convidados os dois, ele para falar dos programas de leitura que implementou quando presidente da Biblioteca Nacional, eu para fazer a conferência inaugural do Encontro dos Promotores de Leitura.
Já havia estado na FIL há dois anos. Mas a emoção de participar continua inaugural. A palavra que me vem à cabeça é "jamboree" , a reunião de todas as tribos num mesmo lugar. São as tribos do livro de toda a América latina, que acorrem com suas colheitas, suas falas, seus pensares. Amigos se encontram, novas amizades se entrelaçam. E se não ardem fogueiras em volta das quais seria bom deitar palavras, é só porque os livros são material altamente inflamável.
No conjunto, só nós falamos outra língua. É um peso inegável, que limita a circulação dos nossos livros, o seu conhecimento e reconhecimento. Eles jogam todos no mesmo time. Nós, basicamente, só jogamos no nosso. E as torcidas não são equivalentes.
Subi no elevador do hotel com Vargas Llosa. Estava sendo homenageado pelos 80 anos e faria a conferência de abertura da programação literária. Olhava para a frente, sem querer ser abordado. Nem me passou pela cabeça lembrar-lhe que no passado remoto havíamos estado juntos em Curitiba visitando, pela mão de Jaime Lerner, o então recém inaugurado Jardim Botânico. Atrás dele, naquela ocasião, vinha a esposa, Pilar. Mas tempo passou, a esposa é outra e teria sido descortês cobrar um reconhecimento impossível. Subimos os dois olhando para a frente.
Assisti a uma mesa divertidíssima de escritores de livros policiais, da qual fazia parte Marçal de Aquino. A sala estava prá lá de lotada. Falaram de crimes, ficção e realidade, e das mulheres fatais que costumam aparecer entre uma e outra. Resultou que nenhum deles tinha mulher fatal em seus romances. Marçal disse que mora com duas mulheres, a filha e a cachorra, e não entende nem a cachorra. A platéia ria. Os autores eram todos homens, e todos desempenados.
Havia 18 entregas de prêmios e homenagens. Fui assistir à palestra da minha amiga argentina, a doce Maria Cristina Ramos que ganhou este ano o mais importante reconhecimento ibero americano de literatura infantil e juvenil, o Prêmio SM. Poeta de grande delicadeza, entremeou a sua fala com alguns poemas seus e muitos poemas alheios, para encantamento do público que reagia cheio de ohhs!
Mas, excetuando a presença das personalidades e a quantidade assombrosa de livros que nos convoca nos estandes, a coisa mais sensacional da FIL é a quinta-feira.
Nesse dia, as escolas secundárias liberam os estudantes, não sem terem-lhes dado antes alguma tarefa literária. E nesse dia, parte do mesmo esforço de introdução dos jovens na literatura, os livreiros abaixam os preços. O que se vê, então, é uma deliciosa horda selvagem ruidosa e risonha invadindo todos os espaços, sentando pelo chão e lotando as passagens, entrando pelos estandes, folheando os livros e até, apesar da vigilância, apropriando-se indevidamente de alguns. A programação para eles é extensa. Há a premiação do Concurso de Criadores Literários Jovens, O Encontro nacional dos Booktube. E assisti ao encontro do poeta Benito Taibo com mil jovens que, de pé debaixo de uma enorme tenda como se estivessem em um concerto de rock, aplaudiam uivando como se idem. Depois de Taibo, haveria mais três palestrantes.