Marina Manda Lembranças E screvo no avião voltando de uma dobradinha literária, a 16º Jornada de Passo Fundo acoplada à 33º Feira do Livr...
Marina Manda Lembranças
A primeira vez que fui a Passo Fundo as mudas das árvores nas calçadas eram novas e a Jornada se firmava pela mão de Tânia Rosing. Era a segunda edição, a grande tenda de circo que a caracterizaria nos anos seguintes ainda não existia, mas já existia o público supreendentemente numeroso vindo de ônibus dos municípios ao redor , e conhecedor da obra dos autores convidados.
Participei várias vezes depois, enquanto a Jornada crescia e com ela a cidade. Fiz palestras, dei oficina de criação literária ,vi o nascer da Jornadinha, as pequenas tendas coloridas para os pequenos leitores, eles também coloridos com mochila e boné da mesma cor da tenda a que estavam destinados. Trabalhei nas tendas e também nas escolas.
Quando a Jornada foi interrompida, o mundo do livro sofreu uma derrota. Agora voltou, e ter sido convidada para este retorno, ainda que sem Tânia, teve para mim um denso valor simbólico.
A tenda de circo já não existe, mas o público, renovado pela passagem do tempo, continua numeroso e replica o antigo entusiasmo.
Faz cerca de 30 anos que estive pela primeira vez em Caxias do Sul. Affonso, eu, Renato Heinrich que nos recepcionava, e a cidade éramos bem mais jovens. A avenida principal ainda não se enobrecia com as cerejeiras japonesas que agora me receberam em plena floração. Mas a Feira já estava lá. E o Museu.
Ao Museu voltei desta vez para ver a rica, encantadora, surpreendente exposição do meu amigo Roger Mello, ilustrador de projeção internacional, com a curadoria do meu também amigo querido Volnei Canonica, anunciada na fachada por uma faixa pintada por Roger com a colaboração da igualmente adorável ilustradora Mariana Massarani. Reconheço, nos queremos bem e poderíamos ser denunciados por formação de quadrilha, mas uma quadrilha estética.
Em Caxias peço sopa de agnolini todas as noites, sorvo de colher o “brodo” generoso em que eles nadam, como folhas de radicchio, e me sinto em casa. Vejo os vinhedos descendo pelas encostas, tomo o vinho produzido com suas uvas, e me sinto em casa. Vou pelo Caminho das Pedras, olho as sólidas casas construídas pelos primeiros emigrantes vindos do Veneto, e me sinto em casa. Em Caxias aqueles sobrenomes todos , com a mesma sonoridade do meu, me dizem que estou em casa.
Participei de mesas três noites seguidas, em Caxias – e agradeço terem me aguentado. As três noites aconteceram em um espaço ligado por outros fios às minhas lembranças, a Galeria de Arte Gerd Bornheim. Um retrato de Gerd, filósofo e pessoa de grande delicadeza recebe os visitantes na entrada da galeria. E eu o revi sorrindo como naquela noite em que jantou em nossa casa com Tonia Carrero, ou na outra em que Affonso e eu jantamos na dele.
A idade nos dá esse presente. Cada fato, cada paisagem, cada percepção se desdobra trazendo consigo ressonâncias afetivas que entretecem presente e passado. Um leque se abre secreto. O íntimo sorri