Marina Manda Lembranças P rimeiro dia do ano, enquanto escrevo. Sol e azul insuperáveis, para alegria dos turistas. E nos veículos, retr...
Marina Manda Lembranças
E o futuro me diz que essa falta de visibilidade à frente, também é um prognóstico. Significa que continuaremos sendo um país sem estabilidade, onde tudo pode acontecer, um país sem balizas.
As cartas e o cristal me entregam algumas coisas mais, verdadeiramente cristalinas:
- não cumpriremos a maior parte das metas , como ninguém acreditou que se cumprissem;
- o saneamento básico não alcançará índices capazes de nos tirar da lista da vergonha entre os países, e corre até o risco de piorar, porque a população aumenta, a desassistida sobretudo, e a necessidade de esgotos aumenta pari passo;
- o atendimento de saúde não atingirá, como nunca atingiu, níveis sequer decentes. Veremos idênticas filas diante da porta dos hospitais e as pessoas só não serão as mesmas porque muitas terão morrido. Haverá macas com enfermos nos corredores, soro pingando na veia — se houver soro. As esperas dos que conseguirem vaga para entrar serão longas, tão esgotantes quanto a doença. E em algum momento seremos notificados de que nesse ou naquele estado houve superfaturamento de equipamentos hospitalares ou remédios;
- com as novas diretrizes curriculares da educação básica o aprendizado poderá até melhorar. Mas sem rever a fundo a formação dos professores , dificilmente alcançaremos os altos níveis de que o país precisa. Não é de surpreender, já que, segundo pesquisas da FGV, a educação pública só preocupa um dentre quatro brasileiros, e aparece apenas em sétimo lugar entre as nossas inquietações;
- aliviada por momentos de paz, este ano também ouvirei os tiroteios da favela ao lado, a Pavão/Pavãozinho que não para de crescer, agora na vertical. Ontem mesmo, enquanto os fogos faziam o deleite de três milhões de pessoas, alguns senhores do morro se deleitaram disparando para o alto rajadas de metralhadoras. Cada um comemora do jeito que lhe é mais familiar;
- continuaremos lutando contra o preconceito e sendo um país racista. As redes sociais colaborando, veremos repetir os mesmos insultos baseados na cor que arrastamos desde o fim da escravidão;
- nesta cidade reconhecidamente gay friendly, homossexuais serão assassinados sempre que sombras mais fundas permitirem;
- tudo indica que aumentará o número de famílias chefiadas por mulheres. Já são 40%, tendo havido em um único ano um aumento de 1,4 milhão. Nenhuma medida ética sendo tomada para ancorar os homens aos filhos que geram, a tendência é que mais mães criem sozinhas as crianças que geraram em companhia. Com isso, a vulnerabilidade social aumentará, já que a renda média das mulheres é menor que a dos homens, e com filhos pequenos — e sem creches — se vêm impedidas de trabalhar;
- o assunto "creche"continuará esquecido;
- haverá fugas e chacinas nos presídios, e as eventuais vistorias encontrarão muitas armas, muita droga e fartura de celulares. Só alguns dos fujões serão recapturados e reconduzidos ao cárcere;
- por bom comportamento, presos de colarinho bem branco cumprirão em casa o resto da pena;
Minha querida Nadir que me perdoe, mas não é difícil ser vidente num país que se repete com tanto esmero.