Marina Manda Lembranças P enso no amor. Em parte, foi provocação de Roberto D’Avila que durante a entrevista me perguntou de supetão: “e...
Marina Manda Lembranças
Entretanto, ao contrário do que pensam e sempre pensaram os jovens, no amor não temos nada de novo. Nem no sexo. Qualquer variante já foi vivida infinitas vezes no passado, qualquer aparente novidade foi testada. Quem duvide, que busque a comprovação na literatura e na música, está tudo lá.
O que sim, muda, e muda bastante, é a aceitação social das variantes do amor e das possibilidades oferecidas pelo sexo.
Não somos tão modernos quanto acreditamos. Na Grécia antiga a relação erótica entre um homem mais velho e um adolescente era considerada parte da formação masculina. Nem impedia que ambos se relacionassem também com mulheres. Alexandre o Grande, cujo maior amor acredita-se ter sido seu amigo e guarda-costas, o General Hefestio, casou três vezes e teve inúmeras amantes. Aquilo que hoje chamamos fluidez, já havia sido inventado.
E nem só na Grécia. A sociedade antiga não tinha um conceito fechado de gêneros, transitava-se livremente entre um e outro atendendo mais ao desejo do que à anatomia. Deve-se ao cristianismo e à Idade Média o fechamento das portas do prazer. E, ainda assim, na Idade Média, as famílias achavam normal que jovens casais solteiros ficassem deitados na cama se bolinando longamente por cima e por baixo das roupas, desde que sem penetração. Os orgasmos múltiplos talvez fossem mais frequentes do que agora.
Adiante, o Iluminismo trouxe à moda todas as perversões. No livro O Gattopardo, cuja ação se passa no século XIX, o jovem Tancredi percorrendo o enorme palácio familiar com a noiva, Angelica, depara-se com um cômodo “pecaminoso”. Ali seus antepassados deleitavam-se com chicotinhos e coleiras.
Semana passada dei com uma longa matéria sobre sites de relacionamento. Será isso tão moderno quanto parece?
Grande parte desses sites está apenas preenchendo o lugar antigamente ocupado pelos medianeiros em relações amorosas (evito o termo alcoviteiros que, sobretudo no feminino, adquiriu ao longo do tempo múltiplos significados).
Moll Flanders, falsa memorialista do livro escrito por Daniel Defoe sob este mesmo título, casou-se cinco vezes. Todas elas através de intermediários. Temos aí uma superposição de datas, porque Moll assina o final de suas memórias em 1683, enquanto Defoe as escreveu em 1721. E essa superposição nos diz que encontrar a alma gêmea, ou a pessoa mais conveniente, nunca foi fácil.
Cada cultura e cada época estabeleceram os lugares propícios ao mercado matrimonial. As igrejas, as festas coletivas, as comemorações de casamentos e batizados, sempre serviram para isso. Até recentemente, quando viúvos e viúvas eram considerados bons partidos, velórios constituíam bons campos de caça. Na minha adolescência, presenciei várias vezes o footing circular de fins de semana, na grande praça central de Friburgo, em que os jovens machos circulavam enquanto as moças, sentadas nos bancos, faziam sua avaliação. Agora, desejando caçar ou ser caçado, acessa-se um site.
Mudou a tecnologia, é verdade. Mas o sentimento que nos move continua imutado, desejo de acolhimento e felicidade, seja por um dia, ou para sempre.