Marina Manda Lembranças N atal se foi, o trenó puxado por renas desapareceu entre nuvens ou entre geleiras, e os bons sentimentos incon...
Marina Manda Lembranças
"Hi, Marina
Se você tivesse sido mais cuidadosa, é provável que não recebesse esta carta. Pessoalmente, não considero que trair alguém seja algo raro. Mas quando seu parceiro descobrir isso, assim como toda a sua família e os seus amigos, pelo Facebook junto com fotos e vídeos, duvido muito que gostem.
Tenho lhe seguido, ultimamente, e tomado fotos suas em ação no seu tempo livre. Acredito que sua família não ficará satisfeita se descobrir esses fatos. Tenho lhe seguido na sua área durante uma semana e tenho evidências mais do que necessárias para acabar com sua vida miserável.
É simples, você só tem uma opção para consertar tudo... Estou lhe oferecendo vinte e quatro horas para me mandar 4700 dólares. Será o suficiente para lhe deixar em paz permanentemente. Cabe a você tomar uma decisão e escolher imediatamente.
Está nas suas mãos. Caso queira que eu esqueça disso tudo, esses são os dados do meu btc wallet:......
Não tente entrar em contato comigo ou com as autoridades, prefiro e-mail para garantir que a polícia não conseguirá me localizar, em qualquer outro caso despacharei instantaneamente vídeos e fotos para todos os que você conhece.
Assim que abrir esta mensagem, você terá somente vinte e quatro horas. Estarei checando meu btc wallet regularmente, e se no tempo determinado não receber nada, começarei a agir.
Não Responda a Este Email"
Imagino que quem frequenta as redes sociais esteja acostumado com este tipo de perversidade polimorfa que aposta no mau comportamento alheio para dele tirar proveito. Mas eu fui surpreendida como se ouvisse o chocalhar de uma cascavel.
Bastam a posse de endereços e a certeza de que entre centenas ou até milhares alguém mais temeroso cairá na armadilha, para colocar em moto o mecanismo. Não há riscos, ninguém chama a polícia por tão pouco. Porque é pouco, menos que nada, em meio à ferocidade que nos submerge nesta era da comunicação.
Não tendo nada a temer, tento ler a carta em sua estrutura.
A primeira frase, transferindo imediatamente a culpa para o receptor, é magistral em sua peçonha. A segunda frase dobra a carga. E logo em seguida vem a ameaça de execração completa, Facebook, fotos, vídeos espalhados aos quatro ventos, o estilhaçar da imagem, o desabar da arquitetura social. O redator entende do assunto. Dosa compreensão (“Não considero que trair alguém seja algo raro”) com insulto (“sua vida miserável”) e, como na frase inicial, remete tudo ao receptor (“ Está em suas mãos”).
Minha única dúvida, na leitura desta carta, é em relação ao preço. Baseado em que critério o autor estabeleceu 4700 dólares? 5 mil pareceria mais redondo, mais fácil, e 300 dólares a mais são sempre convenientes. Considerando, porém, o equilíbrio bem dosado da missiva, sei que algum motivo há de ter, talvez até um limite de segurança.
Termino esta quarta-feira inaugural do ano perguntando-me se, em alguma parte do mundo, um/a amante culpado/a estará depositando na conta do meliante a quantia do seu próprio resgate.