Auditório repleto de olhos e ouvidos ansiosos pela presença daquela que há décadas tem se dedicado à literatura, tendo escrito contos, po...
Auditório repleto de olhos e ouvidos ansiosos pela presença daquela que há décadas tem se dedicado à literatura, tendo escrito contos, poemas, crônicas e tantos outros gêneros discursivos, aquela que já foi agraciada com numerosos e merecidos prêmios, cuja vasta obra artística tanto engrandece a cultura tupiniquim. Grandiosa artista das palavras. Orgulho nacional. Mulher-biblioteca. Marina Colasanti. Para alegria geral dos presentes, surge majestosamente uma pessoa em lindo vestido verde, com um sorriso fácil, jovial, que toma conta de todo o ambiente.
Com simpatia e entusiasmo, a escritora vai comentando sobre diversos aspectos de sua vida e obra, além do evento em si. Eis alguns deles: a alegria de ver tanta gente ali, inclusive jovens; sua militância feminista em uma época na qual tal atitude acabava gerando polêmica, tendo inclusive um texto seu “ido a Brasília e voltado três vezes”; a importância de bons professores na formação intelectual dos jovens, considerando inclusive o desafio de fazer-se isso em um contexto no qual, muitas vezes, a escola fica hipercarregada em suas funções; a importância da boa escrita, da habilidade com as palavras em um mundo tão competitivo...
A inspirada palestra, com formato semelhante a uma conversa informal, continua. Colasanti, sempre fazendo rima com “simpática e radiante”, fala sobre sua experiência com a escrita. Obras clássicas, desfrutadas ainda na infância, abrem-lhe as portas para o maravilhoso mundo da literatura, e essa talentosa escritora faz questão de visitar vários cômodos: os russos (com suas frases longas), os estadunidenses (com suas frases curtas), autores da Itália, da França, da China, do Japão... Ela menciona sua tradução de uma obra do nipônico Kawabata, nome que alguém repito baixinho algumas vezes a fim de memorizar, esquecendo momentaneamente que bastaria fazer uma busca rápida depois.
Como seria de imaginar, Marina, sempre rimando com "mulher-menina", Colasanti, sempre com ânimo contagiante, fala também sobre algumas de suas inspirações brasileiras. Quando menciona Drummond e Lispector, sinto singela cumplicidade literária. “Será que ela também aprecia Raduan Nassar, Lavoura Arcaica?”; “O que ela pensa sobre a verbal alquimia de ficar na esquina entre prosa e poesia?”, alguém me pergunto em silêncio.
Na sequência, a mulher-biblioteca responde às perguntas do público. Quando alguém peço alguma dica sobre o fazer literário, sobre o desejo de dedicar-se a essa nobre arte, a palestrante Colasanti mostra-se, de sua parte, como sempre, solícita e falante, e fala de seu itinerário. Duas coisas ficam ecoando insistentemente. Primeiramente: “É preciso não apenas escrever, mas ler muito”. Segundamente: “É preciso ter uma primeira profissão para pagar o supermercado, pois não é possível viver de literatura no Brasil”. Tudo anotado, devidamente, no livrinho imaginário da mente.
Quando o querido Diego pergunta sobre sua origem, a impressionante Colasanti, mais uma vez, nunca titubeante, se expressa nesse instante. Ela explica que tem três nacionalidades, passeando pela Eritreia, pela Itália e pelo Brasil, e sinto na fala um quê de saudade. Cada um pergunta de acordo com sua especialidade, e a resposta vem sempre com intensidade e sinceridade.
Para minha mais grata surpresa, na sequência, posso prosear com aquela que se expressa com excelência. Pergunto um pouco mais sobre sua obra artística, e falamos sobre questões de estilística. Ela parece sentir-se em casa enquanto falamos sobre a crítica literária simples e rasa. Tudo isso na companhia da Nilva, minha querida confreira, que está presente nesta iluminada quarta-feira.
De fato, estar na presença de Colasanti, a mulher-falante, é um privilégio, não apenas pelas dicas literárias, mas sobretudo pela figura ímpar, admirável, simpática, o ser humano que venceu na vida sem se deixar engrandecer ao ponto da soberba, da arrogância. Marina preserva a beleza e a jovialidade da mulher-menina.
Grazie mille, Marina. Sei un’inspirazione dolce e intensa per me e per molti altri.