Marina Manda Lembranças R eclusos todos, estamos aproveitando o tempo antes indisponível para organizar arquivos, gavetas, caixas, enve...
Marina Manda Lembranças
No ano 2000 esperava-se o aflorar no Mar Mediterrâneo de uma ilha fantasma disputada por três países, Itália, Reino Unido e França. Mas ela negou-se a aparecer. Guardei o recorte, que agora encontrei, porque sua história parecia um conto de fadas.
A ilha fica a quase 40 quilômetros ao sul da Sicília, já próximo da Tunísia, e só deu o ar da graça quatro vezes. A última foi no verão de 1831, a primeira aconteceu em algum momento da Primeira Guerra Púnica que durou de 264 a 241 a.C. As outras duas foram na Idade Média e no século XVI. Agora cochila apaziguada, 8 metros abaixo da superfície. Apaziguada, por enquanto.
Quando emergiu da última vez por força de uma erupção vulcânica, a Itália ainda não existia como país, o que vigorava era o Reino das Duas Sicílias. O Reino a batizou Ferdinandea em homenagem ao rei de Nápoles, Ferdinando II de Bourbon que, a bem dizer, não merecia homenagem alguma, feroz que foi. Para os ingleses o nome era Graham, e Julliet para os franceses. Os três se apressaram a reivindicá-la nos poucos meses em que permaneceu à vista, mas como a erupção havia sido pequena, em menos de um ano voltou a desaparecer levando consigo a disputa.
Na verdade, deveria ter um único nome, Empédocles, como o filósofo e poeta grego, pois é este o nome do vulcão do qual ela é o topo e que a gerou com lava solidificada. No seu último aparecimento foram registrados 65 metros de altura e cerca de 5 quilômetros de diâmetro. Uma insignificância como extensão. Mas sua localização entre Europa e África lhe outorgavam importância estratégica.
Em 2000 voltou-se a falar dela porque um cientista italiano, Domenico Malacuso, detectando atividade vulcânica e fontes de água fervente a 28 metros de profundidade naquela mesma área, anunciou que a ilha poderia vir à tona pela quinta vez. Foi o suficiente para o jornal inglês “The Times” afirmar glorioso: “um pedaço do Império Britânico voltará à superfície”. O Império Britânico afundou definitivamente faz tempo, mas os ingleses se acham proprietários da ilha submersa por terem sido os primeiros a avistá-la no século passado, quando o capitão Swinburne fundeou com o navio “Rapid”, tomando posse dela em nome da coroa.
No século passado, a disputa diplomática entre os três países foi intensa. Não consegui saber o papel da França nessa questão, embora tenha procurado até em enciclopédia. Botei no Google “Ilha francesa Julliet” mas só consegui itens referentes à atriz Juliette Binoche, que sempre se manteve bem acima da superfície.
A ilha que aparece e desaparece como uma fada ou um duende, já mereceu até um livro a seu respeito, e o autor, Salvatore Mazzarella diz que, apesar de oculta sob a água, a ilha “é tão importante agora quando no século XIX”. Nem tanto, porque se no século XIX encontrava-se no meio de importante rota marítima, desde então a rota perdeu sua importância.
Os italianos não se intimidam. O chefe do serviço jurídico internacional da Marinha afirmou que Ferdinandea se encontra na plataforma continental da Itália, e portanto sob jurisdição do país. E mergulhadores italianos cravaram uma bandeira no topo do vulcão Empedócles. No caso dele aflorar , seja à hora que for, já virá com o pendão tricolor tremulando ao vento.