Marina Manda Lembranças C omo boa jornalista que sou, sei que o assunto Meghan/Harry já prescreveu. Mas uma coisa que eles disseram não pres...
Marina Manda Lembranças
Marina Manda Lembranças
Não assisti à famosa entrevista porque fui educada para não ouvir vida alheia atrás das portas, mesmo portas escancaradas como a de Oprah Winfrey. Mas o que tenho a dizer a este respeito é que toda família, mesmo as não imperiais, torna-se uma firma ou uma pequena empresa.
Olho a foto da família de Elizabeth reunida em alguma comemoração oficial antes do desligamento voluntário de Harry e Meghan. Conto 20 pessoas entre adultos e crianças, as mulheres todas de chapéu, os homens de farda, com o peito cheio de medalhas que pouco fizeram para ganhar. Família grande, apesar da ausência de Philip há muito acamado, que exige a presença de uma multidão de assessores, secretários, damas de companhia, motoristas e de alguém que os comande. O Palácio de Buckingham tem 400 empregados. Mas é um palácio, de cômodos e salões e corredores incontáveis, que tem que ser mantido limpo e conservado pois a rainha recebe, em representação do Reino Unido.
É uma firma imensa, onde cada qual tem seu papel e sua dotação monetária. Mas em famílias bem menores, cada qual ocupa lugar bem definido, e cada qual tem seu salário ou seu dinheiro entregue em mão ou depositado em conta.
Acabei de receber uma mensagem: “Tivemos uma reunião. Foi bem tensa”. Quatro irmãos reunidos após a morte do pai, que mais deixou dívidas do que haveres. Ainda assim a reunião foi tensa. Foi tensa devido ao temperamento de cada um deles, e em defesa do posto que cada um pensa ocupar na hierarquia da pequeníssima empresa familiar.
No Brasil, infelizmente, quase a metade das famílias tem por chefe uma única pessoa, a mãe. É ela o CEO da empresa familiar já que o corresponsável pelos filhos escafedeu-se. E estamos aqui no polo oposto, bota oposto, ao da família real. Tudo que minimamente entra é repartido entre os filhos, enquanto a mãe se sacrifica, atitude única entre os CEOs.
O modelo de família mais idealizado é o que vemos nos comerciais da televisão, um pai e uma mãe, sócios igualitários, dividido tarefas e salários, filhos obedecendo à hierarquia para manter o invejável “emprego” de filhos.
Mas nas famílias da vida real pode haver muitos outros sócios. Sogros e sogras, eventualmente necessitados de suporte ou, ao contrário, tungados. Cunhados e cunhadas disputando a primazia, primos e primas almejando desempenhar o papel principal. Enfim, uma empresa grande englobando suas associadas, com tudo o que isso comporta de intrigas e invejas.
E há o dinheiro. Os que ganham mais, e mais ostentam. Os que ganham menos e se obrigam a ostentar, ou não ostentam e se roem. Tudo é símbolo de poder, o carro novo, a televisão, o celular, a pintura ou a laje da casa e, acima de tudo, a piscina, a mansão, até o jatinho. E quem mais pode, como em qualquer empresa, mais reúne bajuladores ao seu redor, mais manda.
A acusação de Meghan cabe em qualquer família, não apenas na de Elizabeth. E já havia sido dita pelo pai da rainha, rei George VI, “Nós não somos uma família, somos uma firma”. Uma firma onde cada sócio tem um papel a desempenhar, papel regiamente pago.
Nas outras famílias todo mundo tem seu posto, por vezes arduamente conquistado, mas poucas, pouquíssimas, dispõem de salário equivalente.