Marina Manda Lembranças E stou lendo “Michelangelo, uma vida épica” escrito por Martin Gayford, e publicado pela Cosac Naify. O havia lido ...
Marina Manda Lembranças
Marina Manda Lembranças
Estou lendo “Michelangelo, uma vida épica” escrito por Martin Gayford, e publicado pela Cosac Naify. O havia lido antes, como atestam as observações que fiz ao lado das páginas, mas tinha esquecido tudo. Eu o comprei em 2015 assim que saiu, sete anos se passaram, entre eles a pandemia, que ocupou nossa atenção. Tenho a salvaguarda desses sete anos, para inocentar minha memória.
Escrevi na folha de rosto “Nessas primeiras páginas se vê claramente como 'esculpisse' com a luz. A dele é uma pintura em três dimensões, coisa absolutamente original no seu tempo”.
E anotei abaixo, pg. 513. Tive que procurar porque ainda não cheguei lá – pudera, um livro com mais de 700 páginas! – o que sublinhei era uma lição de vida. Michelangelo exclama endereçando-se ao papa Paulo III “A menos que meu trabalho me renda satisfação espiritual, estou perdendo meu tempo e meu esforço”.
Era muito difícil ser artista na Renascença. Precisava ter o apoio de um cardeal, melhor se do papa da vez, para ter quem fizesse encomendas, encomendas que custavam muito, e uma parte desse dinheiro era repassada ao artista. Não como salário. De modo que o artista era sempre obrigado a cavar novas encomendas.
Não sabia, ou tinha esquecido, que Leonardo e Michelangelo, tinham uma rivalidade sutil, e se inspiravam nas obras um do outro. Assim acontecia também com Rafael, menos sutil porém.
Michelangelo dizia que sua profissão não era pintor, nem arquiteto, sua profissão primeira era a escultura. Entretanto projetou a cúpula da catedral de São Pedro, junto a Bramante. E pintou em afresco o teto da Capela Sistina e O Juízo Final, uma de suas obras primas. As outras são a Pietá e o Moisés, não considero o Davi uma obra prima porque tem a cabeça enorme e mãos idem.
Pouco depois de acabada a pintura do Juízo Final, o papa mandou contratar um faxineiro para manter a parede e o teto livres da sujeira e da fumaça das velas que se acendiam no altar.
Quando fui a primeira vez com meu pai, visitar a Capela Sistina, antes da restauração feita e custeada por uma indústria japonesa, o Juízo Final estava muito escuro, esfumaçado por tantas velas acesas desde a Renascença. Mas não havia fila nem na bilheteria nem no interior da Capela, e pude deitar-me num banco – que pensei que tinha sido feito para esse fim – e admirar o teto.
Quando fui a segunda vez com Affonso, tinha fila extensa na bilheteria que nos obrigou a esperar quase uma hora. E no interior tinha uma turistaria imensa que se deslocava com passos de cágado, bafando nos afrescos e me impedindo de olha-los tão confortavelmente como os havia visto da primeira vez.
Diz o livro que pintar o Juízo Final foi um esforço titânico que ocupou cinco anos da vida de Michelangelo. Ao todo, o mural exigiu 449 dias de trabalho em afresco. Mas isso era só parte da função. As figuras principais eram primeiro desenhadas num croqui, e cada uma delas exigia estudos, muitas vezes com modelos vivos. Só depois eram passadas para o gesso úmido da parede, antes de começar a pintura.
As regras do afresco eram essas, exaustivas, mas Michelangelo havia se recusado a pintar a óleo, como havia sugerido um colega pintor, dizendo “que a pintura a óleo é uma técnica para mulheres e gente vagarosa e preguiçosa como...” e emendava o nome do colega pintor.
Pensei que Martin Gayford, autor do livro tivesse pesquisado Michelangelo a vida adulta toda. Sei agora, que escreveu vários livros sobre pintores. A saber, Van Gogh, Constable, David Hockey, é crítico de arte e de jazz.
O livro tem uma parte de imagens, que me permitiu ver o teto da Sistina e o Juízo Final pela enésima vez.