Marina Manda Lembranças C omeço a crônica falando das árvores que cantam ou que emitem sons. Dentro da mata existem árvores que cantam...
Marina Manda Lembranças
Começo a crônica falando das árvores que cantam ou que emitem sons. Dentro da
mata existem árvores que cantam, assim dizia o meu avô – não sei que avô é
este, porque do artigo em que tirei a frase dizia só: um dos meus
entrevistados me entregou essa alocução. Não sei quem entregou a frase,
portanto não sei de quem é o avô – “As árvores emitem sons quando estão
estressadas ou com falta de água ou podadas, só os insetos são capazes de
ouvi-las ou os minúsculos répteis, a pequena minhoca, por exemplo.
Todas as árvores grandes cantam. As árvores cantam fazendo cair ventania. Para se proteger das doenças, elas cantam também.
Quando rezamos, são as árvores com seu canto que nos acompanham.”
Imagino os pinheiros de Roma cantando todos juntos, em coro, como estudantes desacompanhados.
Tenho na memória uns pinheiros da horta da minha amiga, Dianella, éramos ainda crianças, imagino eles cantando. Tenho uma foto de nós duas sentadas frente aos pinheiros.
Lembro de alguns pinheiros espetados junto a uma cerca onde se faziam cordas de cânhamo, estávamos numa cidade de pescadores, por isso as cordas. Junto de um canal mal cheiroso, os homens aproveitavam a escuridão para mijar.
Recordo os pinheiros estrela onde íamos meu irmão e eu para nos esconder, era uma parte pouco frequentada, quase uma ilha.
Quando cheguei ao Rio, em 1948, tinha 10 anos, viemos de Costellation, os familiares foram nos receber no aeroporto do Galeão, acabado de construir. Houve um almoço de família para nos receber, depois descanso porque vomitei muito no avião, parava demais, quando chegou à África aspirei o ar profundamente, o reconheci. Havia nascido em Asmara, capital da Eritreia e havia vivido três anos em Trípoli na Líbia. Não se esquecem tantos anos de África.
Na semana seguinte tomamos conhecimento do jardim, e pouco depois, entrevemos a mata. Eu não sabia então, mas o Parque Laje era um sobrevivente da Mata Atlântica. Brincávamos de entrar no lago que havia aos pés da cachoeira. E brincávamos de cipó como Tarzan, mas o pouco que conseguíamos era uma ida e volta. Nada como Tarzan que pulava de um cipó ao outro e deslocando-se assim entre macacos
Não posso ouvir cantar as árvores da mata porque ainda não havia lido este estudo.
Lembro de alguns pinheiros, esses que largam no chão uma manta de espetos juntados por um capucho marrom mais forte, que estavam ao alto de uma casa onde a gente ia beber água. Era da marinha, hoje virou o Parque do Arpoador.
Éramos adolescentes do Arpoador, meu irmão Arduino ainda não pegava ondas, só jacaré, tinha uma taboa pintada de xadrez ele e um amigo jogavam damas na taboa. Era frequente ver eles assim. Depois meu irmão construiu uma taboa de madeira, depois fabricou a taboa de isopor e lá se foi desafiando onda após onda, tornou-se o favorito das alunas do colégio São Paulo.
Frequentávamos com uma amiga a rua Joaquim Nabuco, ainda era possível jogar vôlei de uma rede estendida entre duas árvores. Depois a rua se encheu de prédios, e ficou impossível jogar na rede.
Posso ouvir os pinheiros que existiam no passado, frente à casa da minha amiga catarem juntos.
Daqui a pouco vou ouvir as amendoeiras da minha rua, que são árvores enormes, emitindo sons que só os insetos ou os minúsculos répteis podem ouvir.